BRITADOR

Roleta Russa

Se voltou a falar do projeto que pode acabar com a moleza da CBMM e o mercado de nióbio

 Minério de Tomtor terá que ser escoado por estradas de gelo/Divulgação

Minério de Tomtor terá que ser escoado por estradas de gelo/Divulgação

Na semana passada, voltei a ouvir e ler sobre a o projeto Tomtor da ThreeArc Mining, na Rússia. Esse projeto fica na república russa de Yakutia, que tem 1 milhão de habitantes e saída para o mar Ártico, ou seja, frio pacas.

O projeto tem um dos principais depósitos mundiais de nióbio e terras-raras em termos de escala e teor. O depósito está localizado no noroeste de Yakutia e o alvará de pesquisa é de uma subsidiária da ThreeArc, empresa na qual a Polymetal, que no ano que vem deve entrar no ranking das 10 maiores mineradoras mundiais de ouro, tem 9,1%.

Devido à localização remota e aos complexos métodos de processamento necessários, a estratégia será transportar o minério por milhares de quilômetros, por meio de estradas de gelo, barcaças, navios e ferrovias, para uma planta de processamento hidrometalúrgico em Krasnokamensk, no sudeste da Sibéria, perto da fronteira com a China, diz a SRK, contratada em 2019 para estudar o assunto.

Para quem não conhece a questão, estradas de gelo são criadas sobre rios e outras superfícies congeladas, como lagos. Existiu até um reality show com caminhoneiros especializados em estradas desse tipo no Canadá: Ice Road Truckers. Vários episódios da série Estradas Mortais da Netflix também se passam em pistas de gelo.

Uma vez que o minério chegar em Krasnokamensk se inicia a extração de óxido de nióbio e terras-raras, que são economicamente viáveis devido ao elevado teor do depósito. A estimativa de reserva no final de 2019 era de 11,4 Mt de minério que pode ser lavrado a céu aberto, com 6% Nb2O5 e 14,5% total de Óxidos de Terras-Raras (REO).

Essas reservas podem render 0,7Mt de Nb2O5 e 1,7Mt de REO, o que é muita coisa. Mas a planta hidrometalúrgica está projetada para processar 160 mil toneladas de minério por ano, o que vai resultar, de forma grosseira, em 14 mil toneladas de ferronióbio, segundo dados de 2019. Esse volume é 15,7% da exportação brasileira de 2019, que está em recuperação.

O sistema que contabiliza as exportações brasileiras mostra em 2020 a exportação de quase 75 mil toneladas de ferronióbio, que renderam coisa de US$ 1,5 bilhão, enquanto as exportações deste ano, até outubro, já ultrapassam US$ 1,75 bilhão, com 78 mil toneladas negociadas. Notem que o preço médio em outubro foi de US$ 24 mil a tonelada, enquanto em abril tinha sido de 21,5 mil.

Ignorando diferenças de teores e logística, se tudo der certo para os russos, o Brasil perde no máximo 15% do mercado, ou cerca de US$ 315 milhões. Apesar dessa logística maluca, que envolve uma lavra acelerada para acumular minério a ser transportado aos poucos e a desmobilização parcial do sistema de extração, a planta fica perto dos principais mercados mundiais: China, Coreia e Japão.

Polymetal diz que Tomtor está entre os três principais projetos de terras-raras do mundo. Ffora ele há um na Groenlândia e outro na Austrália. A CBMM não pode nem ser comparada pois está totalmente fora de escala. Segundo o USGS, o Brasil tem 16 milhões de toneladas em reservas de nióbio, o suficiente para abastecer o mundo por 200 anos.

De acordo com o relatório anual do USGS, "os recursos mundiais de nióbio são mais do que adequados para atender às necessidades projetadas. A maioria dos recursos identificados de nióbio no mundo ocorre como pirocloro em depósitos de carbonatito (rochas ígneas que contêm mais de 50% do volume de minerais de carbonato) e estão fora dos Estados Unidos", isto é, no Brasil, no Canadá e nesses outros países aí em cima.

Apesar de a Polymetal estar endinheirada, tenho minhas dúvidas sobre a viabilidade do empreendimento. No início do ano que vem, devemos ver os resultados do estudo de viabilidade encomendado para se iniciar (ou não) o trabalho de funding.

Na primeira etapa do projeto, de 14 anos, ocorrerá a lavra de minério rico em nióbio. O minério extraído será armazenado na mina para fornecer alimentação suficiente para mais de 40 anos de processamento na planta hidrometalúrgica a ser construída na Sibéria.

Caso o aquecimento global não acabe com as estradas de gelo, a etapa 2 verá o recomeço da mineração a céu aberto após o armazenamento do minério durante a fase 1 ser totalmente processado para completar a mineração e armazenar o minério para mais 27 anos de processamento. De acordo com a Polymetal, o ROM da fase 2 terá um maior teor de elementos de terras-raras (REE) e menores teores de nióbio.

A planta irá produzir óxido de nióbio, que será convertido em ferronióbio, junto com um concentrado de carbonato de terras-raras para a produção de óxidos Ce, La, Nd, Pr e outros carbonatos mistos. A conclusão é que a família Moreira Salles nada tem a temer, já o mercado de terras-raras pode, sim, passar por mudanças.