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Um estudo recente da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI) revelou que cerca de 1 milhão de toneladas de sucata eletrônica, formada por monitores de computadores, telefones celulares, impressoras e câmeras fotográficas, entre outros equipamentos, é descartado todos os anos no Brasil. Apenas uma pequena parcela é reciclada devido ao alto custo e poluição gerada pelas técnicas atuais no país,um dos campeões mundiais na geração de lixo eletrônico.
“Já se usam bactérias para bioprocessamento de metais em minas ou para a recuperação de rejeitos metálicos em barragens. A nossa ideia foi usar o método para recuperar cobre a partir da sucata”, afirmou o engenheiro metalúrgico e professor da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP), Jorge Tenório.
Segundo Tenório, o minério de cobre extraído pela Vale tem uma concentração de menos de 1% de cobre, enquanto uma placa de circuito impresso de computador contém cerca de 30% do metal.
Atualmente já é possível reaproveitar o cobre e outros metais presentes nas placas de circuito impresso por meio de processos químicos, mas que resultam na emissão de gases poluentes. “A vantagem da nossa técnica é ser mais barata do que as convencionais e não agredir o meio ambiente”, diz Luciana Yamane, aluna de doutorado no grupo de Tenório.
Luciana explica que o primeiro passo é o processamento mecânico das placas de circuito. Elas são picotadas e trituradas em um moinho até virarem grãos com até 2 milímetros de diâmetro. Em seguida, usa-se um separador magnético para a retirada das partes contendo ferro e níquel. “Trabalhamos somente com o resíduo não magnético, que é o que contém cobre”, disse.
O próximo passo é adicionar os grãos da placa em uma solução aquosa com ferro em sua forma solúvel (íon ferroso ou Fe+2). Quando a bactéria Acidithiobacillus ferrooxidans linhagem LR é inoculada nesse meio, ela oxida o íon ferroso, transformando-o em íon férrico (Fe+3). Este, por fim, oxida o cobre, que é liberado dos grânulos da placa e é dissolvido na solução, processo conhecido como biolixiviação.
Para Luciana, o grande desafio foi condicionar os microrganismos, cujo hábitat natural são rochas contendo ferro, a sobreviver e se reproduzir no meio líquido com as placas trituradas de circuito. “Sempre que adicionávamos esses pedaços triturados no meio de cultura das bactérias, elas morriam. Certos componentes das placas, como fibra de vidro, resinas e materiais cerâmicos, são tóxicos para elas”, disse.
A saída foi fazer uma lenta adaptação do microrganismo às placas. “Começamos misturando 1,25 grama de placa para cada litro de solução contendo as bactérias. Selecionamos os microrganismos resistentes, aumentamos sua população e elevamos a concentração. Repetimos esse processo várias vezes até que, no final do estágio adaptativo, conseguimos misturar 28 gramas de placa por litro. Quanto maior a concentração, mais produtivo é o processo de recuperação do cobre. Isso significa que mais placas podem ser processadas de uma só vez”, afirmou Luciana.
Segundo o professor Tenório, o processo bio-hidrometalúrgico permite extrair 99% do cobre presente no pó triturado das placas de circuito impresso. Ele afirmou que o objetivo inicial da pesquisa não era simplesmente recuperar o cobre dos circuitos impressos. Sua intenção era criar uma sequência de etapas que, ao final, deixasse somente resíduos de ouro impregnados nos grãos triturados das placas. “Esse metal também está presente nas placas de circuito impresso numa baixa concentração de 0,01%. Pode parecer um teor insignificante, mas 1 tonelada de placa contém 100 gramas de ouro”, disse.
“A cianetação, método para extração do ouro, não pode acontecer na presença de outros metais, principalmente o cobre. Daí a importância de recuperar primeiro o cobre para, depois, extrair o ouro das placas”, afirmou Luciana.
As informações são da Revista Pesquisa, da FAPESP.