BRITADOR

Carnaval Elétrico

Um integrante do governo indonésio confirmou que iniciará conversações com a Tesla de Elon Musk sobre um potencial investimento no desenvolvimento de baterias de lítio-íon no país, que tem as maiores reservas de níquel do mundo e reservas significativas de cobre. A notícia vem depois de Musk, que até janeiro foi o homem mais rico do mundo, anunciar acordos de níquel com Vale, BHP e falar em dar golpe na Bolívia.

Carnaval Elétrico

A Tesla já é um grande cliente da Norilsk Nickel, maior produtora do metal depois da Vale, contudo, um enorme vazamento de diesel em planta da Norilsk na Rússia, no fim de maio do ano passado, mudou o cenário. Afinal, como vender um produto ecologicamente correto, como um carro elétrico, se os insumos vêm de uma cadeia de suprimentos contaminada?

A título de linha do tempo, depois do acidente da mineradora russa (que lhe rendeu uma multa de US$ 2 bilhões), temos um tocante pedido de um dos homens mais ricos do mundo: "Por favor, produzam mais níquel." Pelo visto, ele não foi ouvido.

Quando fez o choroso apelo, o metal, mais usado em aço inox do que baterias, estava cotado a US$ 13.500 a tonelada, segundo a LME. Na quinta-feira passada, fechou a US$ 18.500, ou seja, com 37% de aumento e chegando ao valor mais alto em oito anos.

No mesmo mês, Musk tuitou "vamos dar golpe em quem quisermos", disse, em referência à Bolívia, potencial grande produtora de lítio, mas onde a eleição presidencial tinha sido adiada. O dono da montadora Tesla é atualmente o sétimo homem mais rico do mundo, com patrimônio estimado em US$ 177 bilhões, o que dá 4,3 vezes o PIB da Bolívia.

Ainda em julho, a Tesla anunciou um acordo com a Vale Nova Caledônia (VNC) para reservar níquel. No fim de setembro, foi divulgado que a canadense Giga Metals estaria em conversas com a Tesla para produzir níquel "de baixo carbono".

Em outubro, a Vale disse que negociava contrato de fornecimento de níquel com Tesla e outras montadoras. No mesmo mês, a Tesla anunciou que negociava fornecimento de níquel com a BHP. Em resumo, a Tesla não esconde seu interesse pela mineração, clique aqui e leia o que escrevi sobre o assunto em setembro.

 A notícia de uma proposta de investimento na Indonésia foi revelada pela primeira vez por um alto funcionário, Septian Hario Seto, coordenador de investimentos e mineração. Uma evidência de que a Indonésia se prepara para valorizar seus ativos minerais é o anúncio extraoficial de que a deposição de rejeitos minerais no fundo do mar, prática de algumas minas de níquel, será proibida. Essa medida é fundamental para o tal níquel verde, "de baixo carbono".

De acordo com analistas de pesquisa de commodities da Roskill, esse desenvolvimento representa potencialmente outro impulso para a Indonésia, o maior produtor mundial de níquel.

Em um relatório preparado pela Roskill para a Comissão Europeia, a demanda global de níquel usado em carros elétricos (EV) foi estimada em 2,6 milhões de toneladas em 2040. No ano passado, o setor de EV usou somente 92.000 toneladas do metal. É um número assustador. Em 2019, a produção de níquel nas minas foi de 2,7 milhões de toneladas, logo será preciso quase duplicar a produção mineral de níquel para atender a fome por baterias para carros.

De volta à Indonésia, o país tem fortalecido sua posição na cadeia de suprimentos de baterias de íon de lítio por meio de vários grandes investimentos internacionais. No final de 2020, a LG Chem assinou um memorando de entendimento para um acordo de fabricação de baterias EV com o governo no valor de US$ 9,8 bilhões. Essa mesma empresa, maior firma coreana de produtos químicos e fornecedora da Tesla, fez um mega acordo com a chilena SQM para garantir lítio e criou uma empresa só para baterias.

Além de ter como alvo o mercado de baterias de íon-lítio, a Indonésia também teve sucesso em atrair investimentos para uma cadeia de suprimentos de aço inoxidável totalmente integrada. O país do sudeste asiático é o maior produtor de ferro-gusa de níquel (NPI), uma matéria-prima usada na fabricação de aço inoxidável. NPI que não é consumido internamente é exportado para a China, o maior consumidor do mundo. Siderúrgicas que se preparem, o preço do níquel deve continuar a subir.

E nem com o preço acima de US$ 18 mil a tonelada a Vale desiste de vender a VNC, em Nova Caledônia, cuja mina Goro deve ser fechada neste ano (pois a venda para um grupo australiano não foi adiante). Não muito distante da Indonésia, o clima esquentou nessa região autônoma da França, rica em níquel. Os grupos que querem a independência (contra mineradoras) se atracam como os conservadores (a favor de mineradoras) e partem para briga. Aparentemente, Musk não tuitou nada sobre o assunto, mas aposto que Evo Morales discorda desse comentário.