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OPINIÃO: As térmicas a carvão mineral na Nova MP 735

O advogado e professor Rodrigo Bernardes Braga aborda, em um artigo exclusivo para o Notícias de ...

OPINIÃO: As térmicas a carvão mineral na Nova MP 735

A participação das fontes renováveis na matriz energética brasileira continua sendo uma das mais elevadas do mundo, com 41,2% de participação em 2015, conforme BEN (2016). A média mundial está na casa de 13% a 14%. Entre as fontes não-renováveis, o carvão mineral responde por 5,9% da matriz, sendo que petróleo e derivados contabilizam 37,3% e gás natural fica com 13,7%, para citar as principais.

Sabe-se que a geração hidrelétrica ainda é muito forte no Brasil, respondendo por aproximadamente 63,2% de toda a produção de energia elétrica, apesar de uma queda paulatina ano após ano, quer por fatores internos (ineficiências) quer por fatores externos (hidrológicos). Com isso, a geração hidrelétrica é compensada pelo aumento na geração termelétrica, mais onerosa. De qualquer forma, um país onde a fonte hidráulica responde por 63% de toda a produção de energia elétrica está na vanguarda da sustentabilidade a despeito de todos os esforços, dificuldades e restrições para se aprovar novos empreendimentos desta fonte em regiões remotas na Amazônia, onde se localizam os potenciais remanescentes. O curioso é que queremos continuar dando exemplo ao mundo, mas ao mesmo tempo esbarramos num discurso enviesado contra a implantação de hidrelétricas com reservatórios no país, o que elevou a aprovação de usinas a fio d´água nos últimos anos.

O uso do carvão mineral sempre foi atacado pelos ambientalistas, sendo apontado como vilão do aquecimento global. É fora de dúvida, porém, que a grande quantidade do mineral no mundo ainda vai ser usada por longos anos. Para se ter uma ideia, os Estados Unidos lideram a lista em matéria de reservas provadas, com 237 bilhões de toneladas, respondendo por 27,6% da fatia das reservas globais, seguidos pela Rússia, com 157 bilhões de toneladas e 18,2%; China, com 114 bilhões de toneladas e 13,3%; Austrália, com 76,4 bilhões e 8,9% e, finalmente, Índia, com 60,6 bilhões de toneladas e 7%. O Brasil tem apenas 4,5 bilhões de toneladas em reservas provadas.

O carvão ainda constitui a segunda fonte de energia mais importante no mundo, suprindo uma parcela de aproximadamente 30% da oferta total de energia primária. Na percepção da IEA (World Energy Outlook, 2014), a utilização do carvão para emprego na geração elétrica crescerá 0,5% ao ano entre 2012 a 2040. Esta percepção é importante quando associada a outra que indica o protagonismo de China e Índia na definição de suas políticas energéticas, levando em consideração que os dois países são responsáveis atualmente por 75% do consumo entre os países emergentes. No quesito “capacidade instalada”, a China é a principal geradora à carvão, onde esta fonte representa mais de 70% na matriz elétrica interna, sendo a hidroeletricidade apenas 25%.

Basicamente, o carvão se divide em carvão vapor, baixa qualidade, que é usado em caldeiras para produção de vapor ou energia térmica e carvão metalúrgico, alta qualidade, utilizado como matéria-prima na fabricação do coque em processos siderúrgicos. A classificação, portanto, está ligada ao seu grau de carbonificação. O carvão vapor tem baixo PCI e produz grande teor de cinzas..

No Brasil, as principais reservas são compostas pelo carvão dos tipos linhito e sub-betuminoso, baixa qualidade. As maiores jazidas situam-se nos estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina. As menores, no Paraná e São Paulo. Do volume de reservas, o Rio Grande do Sul responde por 89,25%; Santa Catarina, 10,41%; Paraná, 0,32% e São Paulo, 0,02%. A jazida de Candiota (RS) é seguramente a mais importante. No final de 2010 teve início a operação da Fase C- Candiota III da Usina Termelétrica Presidente Médici (Eletrobrás CGTEE), com incremento de 350 MW, somando-se as unidades A e B com capacidade de 446 MW.

Assim, entre as fontes disponíveis, o carvão se torna mais uma opção no mix energético, desde que seja devidamente incentivado e possa contar com tecnologias de geração com emissões reduzidas de gases poluentes e particulados. Em 2002, o governo editou a Lei 10.438, através da qual criou a CDE (Conta de Desenvolvimento Energético) que, entre suas finalidades, está a de promover a competitividade da produção de energia a partir do carvão mineral nacional, prevendo mecanismo de reembolso do custo do combustível. Estava claro que o país queria incentivar as térmicas a carvão nacional, usando recursos do fundo setorial, CDE, para essa finalidade. Pouco a pouco, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel foi exigindo mais eficiência na geração termelétrica a partir do carvão, se quisessem continuar contando com o reembolso da compra do combustível.

Seguindo a mesma linha de incentivo, a MP 735 continua apostando na indústria do carvão e na sua verticalização para produção de energia elétrica. No seu art. 20, diz que “o poder concedente deverá criar programa de modernização do parque termelétrico brasileiro movido a carvão mineral nacional para implantar novas usinas que entrem em operação a partir de 2023 e até 2027, com o intuito de preservar no mínimo o nível de produção de carvão mineral nacional estabelecido no § 4º do art. 13 da Lei nº 10.438, de 26 de abril de 2002, e incentivar a eficiência de geração, com redução da aplicação de recursos de que trata o inciso V do art. 13 da Lei nº 10.438, de 26 de abril de 2002.”

Veja-se que a MP 735 incentiva a implantação de novas usinas térmicas a carvão, mas exige que estas sejam mais eficientes, o que possibilitará reduzir gradualmente a dependência do subsídio ao custo do combustível. Uma das exigências é que as usinas reduzam, a partir de 2023, a emissão de gases de efeito estufa (CO2/kwh) em, no mínimo, 10% em relação ao parque termelétrico a carvão mineral nacional instalado na data de publicação da lei de conversão da MP.

A reação dos ambientalistas foi imediata. Argumentaram que o artigo “representaria um retrocesso na política energética brasileira”, quando o mundo todo tem assumido compromisso com a redução das emissões de gases de efeito estufa e investido em energias renováveis.

Não posso concordar com esses argumentos pela simples razão que apresentamos mais acima. Entre nós, a participação das renováveis é extremamente elevada, sendo o carvão mineral uma fonte reconhecidamente complementar, com baixíssima participação na matriz elétrica. Adicionalmente, dadas as ineficiências identificadas na geração hidrelétrica, somados os cenários de restrição ambiental para novos empreendimentos, a geração termelétrica, mais confiável e não sujeita às intermitências solares e eólicas, parece ser a opção mais realista. Contar com o carvão mineral, desde que novas tecnologias proporcionem aumento da eficiência operacional e ambiental, como deseja a MP 735, representa antes um alinhamento estratégico que uma medida condenável.

Rodrigo Bernardes Braga é professor do curso de pós-graduação do Ibmec/MG, co-fundador e sócio da SRT Energia S.A.